A suspensão da assistência militar dos Estados Unidos à Ucrânia não levará a um colapso repentino das linhas defensivas da nação comandada por Volodymyr Zelensky – mas pode ter um impacto real na guerra a médio prazo, minando as defesas aéreas e as capacidades de ataque de precisão em particular.
As entregas de ajuda dos EUA pela fronteira ocidental da Ucrânia foram interrompidas na noite de segunda-feira (3), três dias após um confronto extraordinário com o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky na semana passada.
A medida suspende qualquer retirada adicional dos US$ 3,85 bilhões em ajuda militar aprovados pelo Congresso que Trump herdou de seu antecessor, o ex-presidente Joe Biden. Também parece interromper as entregas de equipamento militar já aprovado por Biden.
“É bastante significativo, mas não tão impactante quanto teria sido no início da guerra porque a Ucrânia é muito menos dependente da assistência militar direta dos EUA agora do que antes”, disse Michael Kofman, membro sênior do Carnegie Endowment.
“Mas isso definitivamente afetará a Ucrânia, e o efeito se tornará mais pronunciado depois de alguns meses, à medida que os estoques se esgotarem”, disse ele à Reuters na segunda-feira, pouco antes do corte da ajuda ser anunciado.
Em particular, Kiev pode passar a ter dificuldades para obter substitutos para sistemas sofisticados de defesa aérea usados na defesa contra mísseis russos e para armas de precisão como o sistema de mísseis HIMARS, que é um dos principais sistemas de ataque da Ucrânia, com um alcance de 70 a 85 quilômetros.
Ucrânia reduziu dependência do armamento dos EUA
A Ucrânia dependia fortemente da ajuda militar dos EUA após a invasão russa em fevereiro de 2022, mas sobreviveu a um atraso de meses nos suprimentos no primeiro semestre de 2024, já que os republicanos inicialmente se recusaram a assinar um grande pacote de assistência.
Esse atraso acabou sendo sentido na frente, quando soldados ucranianos reclamaram por meses de escassez significativa de projéteis de artilharia, ajudando a colocar as forças de Moscou de volta na linha de frente após a contraofensiva fracassada da Ucrânia em 2023.
Desta vez, qualquer perda de suprimentos de artilharia dos EUA não deve ser um golpe tão grande, já que a Europa aumentou significativamente seus suprimentos de projéteis e outros países contribuíram direta ou indiretamente.
A Ucrânia agora também usa drones de fabricação nacional para a maioria dos ataques no campo de batalha, disseram especialistas em defesa.
“A artilharia não perdeu seu lugar no campo de batalha, mas vemos que a guerra mudou e agora é baseada em drones. A artilharia precisa estar lá, ela muda as intenções do inimigo, mas a base são os drones”, disse Roman Kostenko, secretário do comitê parlamentar da Ucrânia sobre segurança nacional, defesa e inteligência.
Ele disse que em 2024, 65% dos soldados russos mortos ou feridos pela Ucrânia foram atingidos por drones, enquanto apenas 20% foram atingidos por artilharia, e apenas 10% por artilharia americana.
Mas a perda de projéteis de artilharia de 155 mm, dos quais os Estados Unidos eram o maior fornecedor, parece ser um problema.
“Sei que no momento temos algumas reservas, e acho que, com a intensidade atual dos combates, elas devem durar até meados do verão”, disse ele à Reuters.
Serhiy Rakhmanin, um legislador do comitê parlamentar, disse que muito dependeria agora se os Estados Unidos decidiriam bloquear produtores de países terceiros que detêm licenças de produção dos EUA e estão prontos para continuar fornecendo armas e munições a Kiev.
Os Estados Unidos são o maior doador militar da Ucrânia, tendo entregue ou alocado mais de 64 bilhões de euros (US$ 67 bilhões) desde janeiro de 2022, mostram dados do Instituto Kiel para a Economia Mundial.
A ajuda militar da Europa chega a pouco menos de 62 bilhões de euros.
“Se nossos parceiros europeus tiverem liberdade para agir, se tiverem tempo, desejo, dinheiro e capacidade para nos ajudar, isso não será um desastre”, disse Rakhmanin à Reuters.
Ele destacou em particular os obuses e mísseis de defesa aérea.
Perguntas semelhantes se aplicam ao compartilhamento de dados de inteligência dos EUA e se Washington permitiria que fossem repassados por terceiros países, acrescentou.
Por enquanto, não há sinais de que os Estados Unidos tenham encerrado o compartilhamento de inteligência com a Ucrânia, embora as relações estejam sob grande tensão, pois Washington se envolve diretamente com a Rússia para buscar o fim da guerra na Ucrânia.
“Este é apenas um primeiro passo do desligamento, assim como o reengajamento com a Rússia virá em várias etapas”, disse o Eurointelligence, um think-tank, em uma nota de pesquisa.
“Esta decisão por si só não afetará a guerra de forma material, mas constitui um importante sinal diplomático.”
Fonte: www.cnnbrasil.com.br