O líder do PL na Câmara dos Deputados, Sóstenes Cavalcante (RJ), protocolou na segunda-feira (14) o requerimento de urgência sobre o projeto de lei que anistia condenados pelos atos de 8 de janeiro de 2023. Para que o requerimento fosse protocolado, eram necessárias 257 assinaturas.
O texto recebeu o apoio de 264 deputados, mas dois signatários foram considerados invalidados pela Câmara. Em nota, Sóstenes afirmou que a sua própria assinatura e a do deputado Zucco (PL-RS), líder da oposição na Casa, foram desconsideradas por terem sido feias como líderes e não de forma individual.
A seguir, a CNN explica o que é anistia, o que diz o PL da Anistia e quais as diferenças para a Lei da Anistia sancionada pelo então presidente João Baptista Figueiredo, em 1979.
O que é anistia?
Prevista no Código Penal brasileiro, a anistia é uma forma de extinção da punibilidade de um crime. Ou seja, é a concessão de um perdão a um delito cometido por um brasileiro ou grupo de brasileiros.
A Constituição estabelece que crimes hediondos não podem ser anistiados. Neste rol, estão delitos como homicídio, tráfico de crianças, estupro, genocídio, tortura, tráfico de drogas e terrorismo.
Os condenados pelo 8 de janeiro tiveram a pena imputada a partir dos crimes de associação criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
O que diz o projeto?
O projeto principal sobre a anistia perdoa quem praticou crimes políticos ou eleitorais, sendo manifestantes, caminhoneiros, empresários e todos os que tenham participado de manifestações nas rodovias nacionais, em frente a unidades militares ou em qualquer lugar do território nacional do dia 30 de outubro de 2022 ao dia de entrada em vigor desta futura lei.
Na prática, o texto não beneficia o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que está inelegível até 2030, mas a intenção da oposição é que o perdão se estenda ao ex-chefe do Executivo, para que ele retome a elegibilidade e possa disputar as eleições no próximo ano.
O projeto original é de autoria do ex-deputado Major Vitor Hugo (PL-GO).
Na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), o relator Rodrigo Valadares (União Brasil-SE) fez mudanças e defendeu a anistia de todos que participaram de eventos anteriores ou subsequentes aos atos de 8 de janeiro de 2023, desde que tivessem relação com o perdão aos condenados dessa data.
No entanto, por ter sido retirado da CCJ, o parecer do relator, na comissão, perdeu a validade. O projeto exige agora um novo relatório.
O texto original também perdoa multas relacionadas às condenações de quem participou do 8 de Janeiro.
Concede ainda anistia para quem ajudou no financiamento, organização ou apoio de qualquer natureza aos atos, além de quem fez publicações de endosso nas redes sociais.
Quais as diferenças para a Lei da Anistia de 1979?
Em agosto de 1979, João Baptista Figueiredo, o último presidente da ditadura militar (1964-1985), sancionou a lei n.º 6.683. Na ocasião, foram anistiados tanto os que haviam pegado em armas contra o regime quanto os que simplesmente haviam feito críticas públicas aos militares.
A anistia começou a ser gestada pelo antecessor de Figueiredo. Diante da pressão social e dos sinais de que a ditadura, desgastada, não se sustentaria por muito tempo, o general Ernesto Geisel anunciou em 1974 que daria início a uma “lenta, gradativa e segura distensão”, com medidas que permitiriam a redemocratização no futuro. A anistia estava entre essas medidas.
Figueiredo seguiu e em março de 1979 apresentou o projeto da Lei da Anistia já em junho. Como o Congresso recebeu o texto às vésperas do recesso parlamentar e o presidente da República não autorizou sessões extraordinárias em julho, as discussões legislativas só puderam começar no início de agosto. A aprovação viria a toque de caixa.
Assim que o projeto de lei se tornou público, sem prever a anistia ampla, geral e irrestrita, presos políticos deram início a uma greve de fome em diversos presídios do Brasil, pressionando pela retirada do artigo que os excluía do perdão. Eles ganharam o apoio dos parlamentares do MDB. Um grupo liderado pelo senador Teotônio Vilela (MDB-AL) percorreu várias penitenciárias e se encontrou com os condenados, dando voz ao protesto silencioso que eles faziam.
O segundo problema grave que havia na Lei da Anistia, e que os parlamentares do MDB também tentaram derrubar, era o perdão aos militares que cometeram abusos em nome do Estado desde o golpe de 1964, incluindo a tortura e a execução de adversários da ditadura. A lei lhes deu a segurança de que jamais seriam punidos e, mais do que isso, nunca sequer se sentariam no banco dos réus.
Nesse ponto, a lei era propositalmente obscura. Sem citar os militares, dizia que seriam anistiados todos que tivessem cometido “crimes conexos”, isto é, “crimes de qualquer natureza relacionados com crimes políticos ou praticados por motivação política”. Os agentes da repressão, assim, estariam amparados sob o amplo guarda-chuva dos crimes conexos.
O projeto teve como relator o deputado Ernani Satyro (Arena-PB). No governo do marechal Costa e Silva, ele havia sido ministro do Superior Tribunal Militar, corte que dava a palavra final sobre o destino dos acusados de crimes políticos. Satyro jogou um balde de água fria nas pretensões do MDB. Ele rejeitou todas as emendas que buscavam incluir na anistia os condenados por terrorismo.
O relator também enterrou as tentativas oposicionistas de retirar do alcance do perdão os militares que cometeram abusos contra os perseguidos políticos.
Em 22 de agosto, os senadores e deputados se reuniram na Câmara para votar o projeto. As galerias estavam repletas de familiares dos perseguidos políticos, que vaiavam os políticos da Arena e aplaudiam os do MDB. A sessão foi tão tensa que quase houve agressão física entre parlamentares.
A pressão popular, porém, não surtiu efeito. No fim, em votação simbólica (sem contagem de votos), a Lei da Anistia foi aprovada do jeito que o governo queria. A Arena, afinal, tinha a maioria dos parlamentares, incluindo os chamados senadores biônicos (escolhidos de forma indireta, não pelo voto dos cidadãos, para evitar a hegemonia do MDB no Senado).
Nos meses seguintes, a própria ditadura libertaria os presos que não haviam sido beneficiados pela Lei da Anistia. Enquanto uns ganharam o indulto do presidente Figueiredo, outros tiveram seus processos revisados pelos tribunais militares.
A volta dos exilados também foi considerada parte de uma estratégia. O governo sabia que muitos desses líderes criariam seus próprios partidos, o que acabaria por pulverizar e enfraquecer a oposição. Por isso, logo depois, ainda em 1979, a ditadura extinguiu a Arena e o MDB e restabeleceu a liberdade partidária. Brizola, por exemplo, fundou o PDT.
A divisão dos adversários permitiu que os militares mantivessem total controle sobre a abertura política. Figueiredo devolveria o poder aos civis em 1985.
(Com informações da Agência Senado)
Fonte: www.cnnbrasil.com.br