Mesmo antes do encontro tenso do presidente ucraniano Volodymyr Zelensky na Casa Branca no mês passado, o primeiro-ministro britânico Keir Starmer já falava com confiança sobre colocar tropas britânicas em solo ucraniano – amplamente entendido como forças terrestres – no caso de um cessar-fogo com a Rússia.
Após o revés em Washington, Starmer – junto com o presidente francês Emmanuel Macron e outros líderes europeus – rapidamente reforçou suas promessas de apoio ao líder ucraniano.
“Este não é um momento para mais conversas”, disse Starmer após uma grande reunião de chefes de Estado e líderes de governo em Londres no dia seguinte. “É hora de agir.”
Agora, quatro semanas depois e após mais duas grandes reuniões de líderes europeus, a sensação predominante é de um processo que está desacelerando inevitavelmente. Provavelmente, isso não deveria nos surpreender.
A terminologia preferida agora é “força de reafirmação” para a Ucrânia – a ideia de “forças de paz” europeias já não faz parte do vocabulário. Essa força não atuaria na linha de frente, disse Macron a jornalistas após a reunião de quinta-feira (27) em Paris, nem agiria em nome das forças ucranianas.
Relatos recentes sugerem que Londres, em particular, pode estar esfriando a ideia de enviar tropas para a Ucrânia, mas Macron insistiu que nada foi descartado até agora.
“Estamos analisando possibilidades no ar, no mar e em terra também. Nada está excluído”, disse ele, acrescentando: “Essa força de reafirmação será implantada na Ucrânia.”
Mais detalhes serão divulgados a seu tempo, mas, por enquanto, os chefes militares da França e do Reino Unido têm a tarefa de trabalhar com seus homólogos ucranianos para definir o número de tropas que comporiam essa força, onde seriam posicionadas e quais seriam suas capacidades, disse ele.
No jargão militar, é hora de desenvolver o “conceito operacional” que sustentaria essa força. Quais são as possíveis ameaças que ela enfrentaria? Quais seriam as regras de engajamento?
Essas não são questões simples e provavelmente levarão semanas para serem resolvidas. Inevitavelmente, as respostas precisam considerar uma participação limitada ou inexistente dos Estados Unidos, o que deve desacelerar ainda mais o planejamento.
Para Andriy Zagorodnyuk, ex-ministro da Defesa da Ucrânia, as ambições precisam ser realistas.
Ele destaca os desafios logísticos óbvios representados pelos mil quilômetros de linha de frente de seu país com a Rússia, além da baixa probabilidade de que Starmer e Macron aprovem regras de engajamento que permitam às tropas europeias entrar em combate direto com soldados russos. Segundo ele, um deslocamento avançado das forças terrestres britânicas ou francesas seria uma iniciativa ineficaz, mas um compromisso mais limitado também poderia ser pouco impactante.
“Houve tantas discussões sobre a Europa intervir e ajudar com os acordos de segurança, mas se acabarem enviando 10 mil pessoas para ficar em Kiev, sem poder sair da cidade, isso certamente não mudará nada nos cálculos da Rússia”, disse ele à CNN.
Na verdade, com um efeito dissuasório insignificante, tal movimento poderia até fazer a Europa parecer mais fraca. A tentação da Rússia de humilhar Londres e Paris – rompendo qualquer cessar-fogo com um ataque a centenas de quilômetros das tropas britânicas e francesas presas na capital – poderia ser difícil de resistir.
Em um artigo escrito para o Royal United Services Institute, um think tank de defesa com sede em Londres, Zagorodnyuk, junto com dois colegas, argumenta que uma opção melhor para a Europa poderia ser “botas de aviadores” em solo – um compromisso para vigiar os céus da Ucrânia contra ataques russos.
Tal proteção quase certamente significaria aviões britânicos, franceses e de outras nacionalidades estacionados na Ucrânia, juntamente com as tripulações e suporte logístico acompanhante. Pode ser que a Europa fornecesse cobertura apenas sobre o leste e o centro ucranianos, diz ele, mas mesmo assim, isso permitiria que a Ucrânia dedicasse todas as suas forças para defender a parte oriental do país.
Mesmo uma força de reafirmação que não fosse além de colocar ativos aéreos dentro da Ucrânia ainda seria um grande passo para a Europa. No entanto, os riscos de credibilidade, embora ainda presentes, seriam certamente menores do que com qualquer implantação de forças terrestres.
Ao mesmo tempo, a Europa precisa ser extremamente cautelosa. Gerenciar as expectativas antes de qualquer possível anúncio também é fundamental. A credibilidade de qualquer eventual implantação será julgada em grande parte pela forma como ela se compara ao que foi discutido publicamente anteriormente.
Se parecer que a resposta é insuficiente, não será apenas a Ucrânia que se sentirá prejudicada. Putin e Trump também terão suas suspeitas confirmadas de que a Europa é um “pato manco”.
Fonte: www.cnnbrasil.com.br